O tratamento de prisioneiros de guerra frente a repórteres e câmeras é amplamente considerado uma violação do direito internacional humanitário. No entanto, a Ucrânia decidiu desconsiderar essa norma durante uma coletiva de imprensa recente, onde apresentou dois supostos combatentes capturados da China, o que pode representar um risco à sua imagem internacional.
A China, que se posiciona como neutra no conflito entre Rússia e Ucrânia, sempre orientou seus cidadãos a não se envolver em guerras fora do país. Apesar disso, as ações de Pequim são observadas de perto em Kiev, especialmente em função do seu papel como importante aliado econômico e diplomático da Rússia.
Durante a coletiva, os prisioneiros, vestidos em uniformes de combate e respondendo a perguntas em mandarim, estavam sob vigilância de agentes de segurança ucranianos. Um tradutor auxiliava na comunicação. Os homens, cujos nomes não foram divulgados pela CNN, revelaram que os incentivos financeiros foram um fator motivador significativo para se juntarem às forças russas. Um deles mencionou a busca por uma forma de sustento após ter perdido o emprego durante a pandemia de COVID-19. A promessa de ganhar 250 mil rublos (aproximadamente US$ 3.000) por mês na Rússia era tentadora, especialmente em comparação ao que conseguia em seu país.
Apesar de ter experiência em reabilitação médica, ele foi forçado a treinar para combate ao chegar na Rússia, onde documentos relevantes eram apenas em ruso, causando dificuldades de entendimento, já que nenhum dos dois prisioneiros falava a língua.
A CNN teve acesso a um contrato militar russo assinado por outro cidadão chinês, que indicava compromissos com várias atividades, incluindo combate e participação em emergências. Os prisioneiros relataram um episódio confuso antes de sua rendição na região de Donetsk, onde, após poucos dias de combate, decidiram se render ao perceberem a desorganização das ordens recebidas.
Participação de Combatentes Estrangeiros
A participação de combatentes estrangeiros na guerra é um fenômeno que ocorre desde o início do conflito. A lista de prisioneiros não-russos mantidos pela Ucrânia até o final de 2024 inclui cidadãos de diversos países, como Sri Lanka, Nepal, Somália, República do Congo entre outros. Também foram capturados dois norte-coreanos, parte de uma força estimada em 14 mil soldados enviados por Pyongyang para apoiar a Rússia.
Uma fonte da Inteligência de Defesa da Ucrânia afirmou que a Rússia recorreu a combatentes de fora para manter sua linha de frente, uma vez que enfrenta dificuldades em sustentar o conflito apenas com suas tropas. Após a divulgação da captura dos prisioneiros chineses, a Ucrânia indicou ter informações sobre outros 155 cidadãos chineses envolvidos nas fileiras russas, levantando especulações sobre o envolvimento do governo da China.
Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia, não descartou a possibilidade da presença chinesa ser parte de uma política oficial de Pequim. Ele mencionou que o Serviço de Segurança da Ucrânia investigaria o caso, ressaltando a percepção de que a China estaria consciente da situação.

Os prisioneiros tentaram desvincular suas ações de quaisquer ordens oficiais, citando vídeos de recrutamento no TikTok como inspiração. Um clipe que circula nas redes sociais chinesas apresenta soldados russos em treinamento, enfatizando valores de bravura e oferecimento de compensações financeiras.
Relevância do Momento
A escolha da Ucrânia em promover os prisioneiros chineses é uma manobra atípica, especialmente em um contexto onde a atenção dos Estados Unidos é fundamental para obter apoio. O governo de Joe Biden está focado em pressionar a China, percebida como um dos principais adversários geopolíticos pelos EUA.
Além disso, a decisão da Ucrânia pode também ser uma estratégia para contrabalançar propostas da União Europeia em relação à China, destacando a situação dos combatentes chineses no conflito. A mensagem parece clara: há uma tentativa de reforçar a percepção de que o apoio chinês à Rússia vai além do diplomático e econômico, conforme enfatizado pelo analista Anders Puck Nielsen do Colégio Real de Defesa da Dinamarca.
Em resposta, a China solicitou cautela nas interpretações de sua posição, reforçando sua neutralidade na contenda.