Últimas notícias

A obsessão da índia por xarope para tosse

Em setembro, um caso alarmante ocorreu em uma cidade pequena em Madhya Pradesh, na Índia, levando à morte de pelo menos 19 crianças entre um e seis anos. As crianças faleceram poucas semanas após a ingestão de um xarope para tosse amplamente utilizado. Inicialmente, os profissionais de saúde investigaram várias causas, desde a água potável até mosquitos, mas eventualmente descobriram que a função renal das crianças havia falhado devido à ingestão de um solvente industrial tóxico chamado dietileno glicol, que não deve estar presente em medicamentos.

A situação se agravou em estados vizinhos, como Rajasthan, onde a morte de duas crianças após o consumo de um xarope feito com dextrometorfano desencadeou indignação e uma investigação governamental. Essa série de eventos trouxe à tona um problema recorrente na Índia, onde a presença de dietileno glicol em xaropes já causou a morte de dezenas de jovens em outras ocasiões. Em 2023, xaropes contaminados foram relacionados a 70 mortes de crianças na Gâmbia e 18 no Uzbequistão. Entre dezembro de 2019 e janeiro de 2020, um caso em Jammu resultou em pelo menos 12 mortes de crianças pequenas, com alguns ativistas defendendo que o número pode ter sido ainda maior.

A cada nova tragédia, o governo promete reformas, mas produtos contaminados continuam a aparecer no mercado. Isso reflete um sistema regulatório fraco e fragmentado, incapaz de supervisionar a vasta quantidade de xaropes de baixo custo e potencialmente não aprovados, fabricados por pequenos produtores e vendidos sem receita médica. Após os últimos incidentes, o Ministério da Saúde da Índia solicitou que os médicos fossem mais cautelosos ao prescrever tais medicamentos, apreendeu amostras do xarope contaminado, suspendeu e proibiu vendas, além de determinar uma investigação.

Os críticos apontam que o problema vai além da prescrição excessiva. A atual tragédia expõe falhas profundas no sistema de fiscalização de medicamentos da Índia, onde o mercado de xaropes para tosse está projetado para crescer significativamente nos próximos anos. A dependência cultural dos xaropes para tosse contribui para essa crise. Muitas vezes, mesmo quando a eficácia dos xaropes é questionável, eles são amplamente utilizados por médicos e pacientes, que buscam alívio rápido para tosse e dor de garganta. Esses xaropes geralmente contêm açúcar, corantes e uma mistura de substâncias que podem não ter um benefício real e que podem até representar riscos à saúde.

A maioria das tosses infantis é viral e se resolve sem intervenção, mas os médicos frequentemente prescrevem xaropes em vez de tratamentos mais eficazes, como broncodilatadores em inaladores ou nebulizadores, que são recomendados para tosse persistente causada por alergias, cada vez mais comuns em cidades indianas poluídas. Em muitas áreas rurais, cerca de 75% das consultas de saúde são feitas por praticantes informais que carecem de treinamento formal. Isso resulta em uma dependência de xaropes como a principal solução para problemas respiratórios, mesmo quando não são a abordagem mais segura ou eficaz.

Além disso, muitos pacientes, especialmente em regiões menos urbanizadas, buscam ajuda em farmácias locais, onde os funcionários podem não ter o conhecimento adequado para orientar sobre o uso correto dos medicamentos. Essa falta de informação contribui para um ciclo vicioso de automedicação e prescrição inadequada.

É essencial a criação de uma política clara sobre o uso de xaropes para tosse e a implementação de uma campanha de conscientização nacional para médicos e pais, visando a redução da prescrição imprudente. A situação é crítica, e especialistas destacam que é necessário um esforço conjunto para evitar novas tragédias.

Artigos relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

2 × 3 =

Botão Voltar ao topo