A Profunda Saudade do Orkut e o Legado de Conexão que Deixou

Nunca vou me esquecer da primeira vez que me deparei com a palavra saudade. Foi após o encerramento do Orkut, uma plataforma que marcou uma geração de usuários da internet. Quando o site foi desativado, inúmeras mensagens surgiram de diversas partes do mundo. Todas tinham um sentimento em comum: ‘saudade do Orkut’. Inicialmente, acreditava-se que fosse apenas nostalgia pelo site em si, mas a palavra saudade se mostrou mais profunda e complexa do que uma simples lembrança.

A palavra saudade, um termo presente somente na língua portuguesa, é descrita comumente como um sentimento de ‘longing’, uma espécie de anseio ou desejo profundo. No entanto, essa tradução não abrange sua totalidade. Saudade é um sentimento, um estado de espírito que transcende o simples ato de sentir falta. É como o silêncio dos marinheiros que acenam ao partir, esperando um dia retornar. É a dor da ausência, o peso do que foi perdido, algo irreversivelmente fora de alcance. Sentir saudade, como explicaram amigos brasileiros, é recordar não só de pessoas ou lugares ausentes, mas também de versões passadas de si mesmo que não voltarão.

Um amigo uma vez compartilhou: “Sinto falta dos almoços de domingo, do som das risadas ecoando pela casa, da sensação de pertencimento.” Isso ilustra o conceito de saudade, uma memória tão viva que parece habitar nossos ossos. Essa definição ficou ainda mais clara na perda pessoal do criador do Orkut: a saudade do pai, um cirurgião que marcou sua cidade com atos de humildade e compaixão, tocando vidas de maneira tão íntima que, mesmo após sua morte, seu impacto ainda era sentido por muitos.

Com o surgimento do Orkut, a intenção era simples: unir pessoas. Não era sobre métricas ou branding, mas sobre conexão genuína em uma internet que ainda era um espaço de possibilidades imensas. As pessoas se apresentavam como eram: desajeitadas, engraçadas, e gentis, sem as edições que tantas vezes vemos hoje. O sentimento de saudade do Orkut pode ser visto como um lamento por uma era digital em que a internet parecia trazer pessoas para mais perto, ao invés de isolá-las em suas bolhas pessoais.

O encerramento do Orkut, substituído pelo Google Plus, exemplificou uma mudança maior na dinâmica das redes sociais e na percepção da internet como um espaço para conexão humana. As mensagens que chegaram após seu término mostraram que as pessoas não lamentavam apenas a perda de um site, mas a perda de uma era em que essas conexões tinham mais profundidade, significado, e humanidade.

Neste contexto, a reflexão sobre as redes sociais modernas se expande com a leitura de ‘Careless People: A Cautionary Tale of Power, Greed, and Lost Idealism’, de Sarah Wynn-Williams. Contrariando a época do Orkut, a obra revela como empresas, como o Facebook, priorizaram o crescimento acima de tudo, sacrificando o bem-estar social. A exposição dos adolescentes a conteúdos que maximizavam o tempo de engajamento, mesmo às custas de seu bem-estar mental, é um retrato alarmante das escolhas estratégicas feitas dentro dessas corporações.

A saudade do Orkut nos lembra não apenas daquilo que perdemos, mas do que podemos aspirar com as tecnologias futuras. Ela nos desafia a repensar nossa relação com a tecnologia, buscando um equilíbrio que priorize a comunidade, dignidade e alegria. Talvez não possamos recriar o Orkut, mas podemos permitir que a saudade nos guie na construção de um mundo digital que valorize conexões significativas e humanas. O caminho não é apenas sobre lembrar o passado, mas sobre construir um futuro melhor.

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