A ampliação da isenção do Imposto de Renda para salários de até R$ 5 mil mensais gera debate sobre seu impacto na economia brasileira. Economistas destacam que a questão é mais complexa do que parece, apontando três fatores principais que devem ser considerados: a valorização do câmbio, o alto nível de endividamento das famílias e a ociosidade na indústria.
De acordo com Igor Rocha, economista-chefe da Federação da Indústria do Estado de São Paulo (Fiesp), a proposta de isenção deve ser vista como parte de uma reforma tributária que busca mais justiça. Rocha afirma que o câmbio, atualmente em uma posição favorável, está influenciando as pressões inflacionárias. Apesar da taxa de desemprego ter registrado 5,6% em agosto, a inflação continua a desacelerar, impulsionada pelo diferencial de juros, que se mantém entre os mais altos do mundo.
Rocha explica que, se o dólar continuar a cair, isso pode ajudar a conter a inflação, principalmente nos preços dos alimentos, que costumam ser mais sensíveis às variações de demanda. No entanto, ele acredita que a responsabilidade pela redução da inflação neste momento é mais atribuída ao câmbio do que ao aumento da demanda gerado pela isenção.
Outro economista, André Perfeito, fundador da André Perfeito Consultoria Econômica (APCE), complementa que a relação entre aumento da isenção e aumento da demanda pode não ser tão direta. Ele destaca que as famílias brasileiras estão altamente endividadas, o que limita sua capacidade de consumo. Assim, a quantidade disponível para gastar pode não se traduzir automaticamente em uma demanda real significativa.
Ambos os economistas também ressaltam que a indústria tem capacidade ociosa, o que significa que há espaço para aumentar a produção sem necessariamente pressionar a inflação. O Nível de Utilização da Capacidade Instalada (Nuci) na indústria de transformação em São Paulo está em 79,4%, indicando que 20,6% da capacidade permanece disponível para uso. No setor de máquinas e equipamentos, esse índice chega a 78,8%, revelando uma ociosidade de 21,2%.
Os dados sobre a carteira de pedidos no setor de máquinas e equipamentos são preocupantes, mostrando uma queda de 2,5% em agosto, após um crescimento em julho. Essa situação sugere que, apesar de uma possível melhoria na demanda, o setor produtivo teria condições de atender a esse aumento sem grandes dificuldades.
Rocha aponta que a presença de ociosidade na indústria pode ajudar a aumentar a oferta e, assim, aliviar possíveis pressões inflacionárias. Contudo, ele adverte que o mercado de trabalho continua apertado, o que pode limitar aumentos significativos nos salários reais. Assim, a isenção do Imposto de Renda pode resultar em um aumento na renda, mas não necessariamente em um aumento proporcional na demanda.
Um indicador que reflete a cautela da indústria paulista é o Sensor, que registrou 49,6 pontos em setembro, indicando contração da atividade industrial. Embora tenha presentado uma leve alta em relação ao mês anterior, ainda permanece abaixo da linha de 50 pontos, que separa crescimento de contração.
As vendas na indústria marcaram 50,3 pontos em setembro. Embora esse número tenha superado o de agosto, ainda é inferior ao registrado no mesmo mês do ano anterior. Os estoques, por sua vez, apresentaram um leve aumento, mas continuam abaixo do nível que indica estabilidade.
Por esses motivos, Rocha acredita que o Banco Central deve manter sua política cautelosa, aguardando os efeitos do aperto monetário antes de realizar alterações em sua estratégia.