Atraso no Pix parcelado é causado pela crise de segurança das fintechs

O Banco Central (BC) adiou a divulgação das novas regras para a padronização do Pix Parcelado, um movimento que ocorre em meio a uma série de incidentes que abalaram a confiança do mercado financeiro. Recentes ataques cibernéticos a instituições financeiras e operações da Polícia Federal, que expuseram o uso de fintechs por organizações criminosas, levantaram preocupações sobre a segurança do sistema financeiro, fazendo com que o BC mudasse seu foco para reforçar a solidez e a segurança das bases do setor.
Na visão de Auziane Morais, especialista em compliance de uma fintech, a situação atual exige uma reavaliação das posturas no mercado. Para ela, a confiança do usuário é essencial e, sem ela, todos os envolvidos no sistema financeiro enfrentam perdas. Morais destaca que não adianta focar em inovação se a credibilidade geral está em risco. Para restaurar essa confiança, o setor precisa de mais cooperação e mecanismos de autorregulação.
Pedro Carvalho, diretor sênior da Fitch Ratings, aponta que o BC está diante de um dilema. Ele precisa garantir a segurança do sistema sem impedir inovações. O adiamento das regras trouxe incertezas, especialmente para empresas que se preparavam para implementar o Pix Parcelado. Esses atrasos afetam os investimentos e a previsibilidade necessária para o crescimento das fintechs e de fornecedores de infraestrutura.
Dentro do setor, há um clamor por uma governança mais eficaz e uma conduta ética mais rigorosa. François Guérin, diretor de serviços de banking, ressalta que a adoção de regras já estabelecidas é fundamental, mas que a verdadeira mudança depende da integridade das pessoas que atuam nas instituições.
O BC já anunciou algumas iniciativas de segurança, como a exigência de um capital mínimo de R$ 15 milhões para prestadores de serviços de tecnologia da informação, que são importantes para a conexão ao sistema financeiro nacional. Esse tipo de governança é considerado uma boa prática, mas pode ser visto como uma reação tardia às preocupações já existentes no mercado.
Outra questão levantada é a sobreposição regulatória entre diferentes órgãos, como o BC e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Alexandre Assolini, diretor de segurança da Vórtx, alerta que essa duplicidade pode resultar em lacunas na regulação. Ele afirma que a existência de dois reguladores pode criar “frestas”, onde situações de risco podem passar despercebidas.
Recentemente, a Polícia Federal lançou operações que desmantelaram um esquema criminoso bilionário no setor de combustíveis, relacionado a uma facção criminosa. Esse esquema resultou na não arrecadação de R$ 7,6 bilhões em tributos, revelando falhas em diversos segmentos da cadeia produtiva. Fintechs e fundos de investimento foram usados para a lavagem de dinheiro e disfarce de transações ilícitas.
Além disso, o setor financeiro enfrentou uma série de ataques cibernéticos nos últimos meses. Em julho, a C&M Software teve sua infraestrutura comprometida, e em setembro, a fintech Monbank sofreu um ataque que resultou no desvio de R$ 4,9 milhões. Embora a companhia tenha informado que a maioria dos valores já foi recuperada e nenhuma conta de cliente foi afetada, a ocorrência levanta questões sobre a segurança dos sistemas. Outra fintech, a Sinqia, também relatou um ataque que resultou em transações não autorizadas, somando aproximadamente R$ 710 milhões.
Esse contexto revela a necessidade urgente de revisão de práticas e atividades no setor financeiro, com foco na proteção do sistema e na restauração da confiança dos usuários.